As nuvens cinzentas do inverno cresceram dentro de nós e precisávamos de espairecer. Por isso, no fim-de-semana, fomos conhecer as aldeias de xisto que se situam no concelho da Lousã, nomeadamente: Casal Novo, Chiqueiro, Talasnal, Cerdeira e Candal.

Nesta altura do ano, ondas de nevoeiro cobrem frequentemente a serra da Lousã, pintada de verde e amarelo. Cheira a pinheiro, eucalipto, flores de mimosa e a terra molhada pela chuva. Ouvem-se os sons relaxantes da água nas ribeiras e os pássaros a chilrear.

Nas aldeias quase não se vêem pessoas, mas há gatos e cachorros simpáticos à espera de festinhas. Apesar de vazias, sentimos a paixão que os donos das casas recuperadas têm pelas aldeias. Basta reparar nos pormenores: nas pedras de xisto que cobrem as calçadas e as paredes das casas; nas ardósias que lhes seguram cuidadosamente as telhas; nos potes pretos de ferro iguais aos que havia na casa dos meus avós a servir de vasos; nas cortinas de renda iguais às que a minha mãe aprendeu a fazer e a bordar com a sua mãe. São pormenores que me ligam às minhas raízes tal como as aldeias contam o passado do nosso país.

Aldeias de xisto do concelho da Lousã

1. Casal Novo

Começámos o nosso passeio por esta aldeia que se alonga encosta abaixo. Descemos umas escadas íngremes, querendo ver tudo rapidamente até sermos obrigados a parar por uma chuva fortíssima. Abrigámo-nos na entrada de uma casa e foi então que percebi: estas aldeias não são apenas para ver, até porque se visitam num instante. É preciso parar – parar para apreciar, parar para olhar para a chuva, parar para namorar, parar para sentir e pensar no que se está a viver – em vez de simplesmente se passar pela vida a correr.

Aldeia de xisto de Casal Novo, Serra da Lousã

2. Chiqueiro

Do Casal Novo fomos a pé até à aldeia de Chiqueiro, por um trilho assinalado (1km, 30 minutos). Com os guarda-chuvas pendurados nas mochilas, caminhámos pelo meio da floresta, ouvindo os pássaros e as gotas a cair das árvores, pois acabara de chover. No cimo do monte, a meio do caminho, descobrimos umas letras enormes de madeira onde se lê a palavra “Lousã” com vista para a vila. Depois descemos pelo meio da estrada (deserta e envolta pelo nevoeiro) até Chiqueiro. À semelhança de Casal Novo, encontrámos a aldeia quase deserta, mas fizemos um amigo chamado “Pastel”. Fizemos-lhe festinhas e demorámo-nos a fotografá-lo de vários ângulos, aparecendo depois uma senhora que se virou para ele e lhe disse: “ Estás feito vedeta hoje, pastel?”.

Aldeia de xisto de Chiqueiro, Serra da Lousã

3. Talasnal

É a aldeia onde encontrámos mais movimento: de moradores e de visitantes. À semelhança das outras aldeias de xisto, no Talasnal conjugou-se, com sabedoria e bom gosto, a rusticidade de uma aldeia e o conforto dos nossos dias. Os caminhos e as casas são todas de xisto, há cortinas bonitas a espreitar das janelas e pormenores encantadores espalhados por toda a povoação, donde se avista, lá no fundo, o castelo da Lousã. Quem quiser ver a aldeia à distância, assente sobre socalcos e rodeada pelas montanhas, poderá parar numa espécie de miradouro existente na estrada que conduz à mesma. Nós gostámos tanto da vista que voltámos ao anoitecer para ver as luzes da aldeia a acenderem-se e a tornarem tudo (ainda) mais romântico.

Talasnal, uma aldeia de xisto na Serra da Lousã

4. Cerdeira

Chega-se a esta aldeia atravessando a pé uma pequena ponte e há logo uma caneca, à entrada, para bebermos água fresca. Quase todas as casas foram recuperados e transformadas em turismo rural pelo projeto Cerdeira – Home for Creativity, que também promove retiros artísticos. Que vontade de ficar por ali uns dias, de nos sentarmos numa das varandas voltadas para a serra a apanhar sol. Há um café, uma galeria e uma biblioteca. E mais uma vez ouvem-se: as águas de uma ribeira e os passarinhos a chilrear.

Veja também o artigo que escrevemos sobre a nossa estadia na aldeia do xisto da Cerdeira.

Aldeia de xisto de Cerdeira, Serra da Lousã

5. Candal

Da Estrada Nacional N236, Candal não parece muito interessante, já que os edifícios que ladeiam o alcatrão são de cimento e alguns estão degradados. Para descobrirmos as casas de xisto e ganharmos uma perspetiva geral da aldeia, precisamos de subir as suas ruelas íngremes, por onde corre um regato que nos enche de sons relaxantes.

Aldeia de xisto de Candal, Serra da Lousã

Baloiçar no infinito

No fim, ainda quisemos ir ao Alto de Trevim, o ponto mais elevado da Serra da Lousã, situado a 1200 metros de altitude. Foi aí que descobrimos, no meio do nada, um baloiço gigante de madeira, que nos fez sorrir como crianças. Coordenadas aproximadas do baloiço: 40°04’36.4″N 8°11’26.0″W

Por tudo isto, sei que é quando viajo que mais gosto de viver.

Baloiço do Alto de Trevim, Lousã
Lousã
Pormenores das aldeias de xisto
Letras de madeira onde se lê Isto é Lousã
Serra da Lousã
Vaso numa das casas de xisto
chaminés numa aldeia de xisto
Mimosas na serra da lousã
Gato
Vasos numa casa de xisto
Aldeias de xisto
Casa de xisto na Cerdeira
Aldeias de xisto da Lousã
Pedras de xisto sobre as telhas
Apreciando a paisagem da Serra da Lousã

Guia prático para visitar as aldeias de xisto da Lousã

A Rede das Aldeias do Xisto é composta por 27 Aldeias, recuperadas graças a uma parceria entre os municípios, a Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto (ADXTUR) e agentes privados. O concelho da Lousã é o que tem mais Aldeias do Xisto no seu território. São cinco: Casal Novo, Chiqueiro, Talasnal, Cerdeira e Candal.

Quanto tempo é necessário para visitar as aldeias?

Um fim-de-semana é suficiente para conhecer as cinco aldeias. Nós visitámos Casal Novo, Chiqueiro e Talasnal num sábado e Cerdeira e Candal num domingo. O nosso conselho é não andar numa correria para ver todas as aldeias de uma vez. Se se apaixonar por alguma, deixe-se ficar e aproveite-a ao máximo, pois as outras não são muito diferentes (embora cada uma tenha o seu encanto).

Passeio de carro pelas aldeias de xisto

É possível efetuar um percurso circular pelas cinco aldeias. São todas acessíveis por carro, estando bem sinalizadas e as estradas completamente asfaltadas.

Trilhos nas aldeias de xisto

A Serra da Lousã dispõe de percursos pedestres muito interessante e identificados que se podem consultar em: http://www.baldioslousa.com/turismo/percursos-pedestres/.

Sapatos de caminhada encostados a uma parede de xisto
Por um dos trilhos da Serra da Lousã
Casa de xisto rodeado por flores amarelas das mimosas
Sofia a fazer festinhas a um gato
Talaniscos
Aldeia de xisto do Talasnal
Pormenores das aldeias de xisto

Onde (gostámos de) dormir perto das aldeias de xisto

Palácio da Lousã Boutique Hotel | Situado em pleno centro histórico da Vila da Lousã, é uma excelente base para partir à descoberta quer das Aldeias do Xisto quer do Castelo de Arouce e das Ermidas da Senhora da Piedade. O hotel é, todavia, só por si, uma experiência, uma vez que está inserido num edifício brasonado do século XVIII, outrora Palácio da Viscondessa do Espinhal, tratando-se de um imóvel classificado como Património Histórico de Interesse Público.

Todo o restauro foi feito com bom gosto e atenção ao pormenor, sem intimidar. O quarto onde ficámos parecia o da viscondessa e as várias zonas de estar são bonitas e acolhedores. O apetitoso pequeno-almoço incluía vários produtos regionais, como doces, compotas, mel da serra da Lousã, presunto e queijos variados, como queijo fresco, queijo do rabaçal e requeijão – tudo servido numa sala soalheira com vista para o jardim do hotel e para a serra da Lousã. O restaurante “Viscondessa – Licor Beirão RestoBar”, situado no hotel, também nos foi recomendado e, se for tão bom ao jantar como é ao pequeno almoço, será uma escolha acertada. A única coisa de que não gostámos? Não termos tido tempo para desfrutar verdadeiramente do palácio: devagar, como fizemos nas aldeias.

Está à procura de outros alojamentos para a sua viagem? Pesquise aqui.

Palácio da Lousã

Onde (gostámos de) comer nas aldeias de xisto

  • Restaurante Ti Lena, no Talasnal | Situado numa casa de xisto, o restaurante por dentro é como uma tradicional casa de família. Entra-se, sem cerimónias, pela cozinha para uma pequena sala-de-jantar com uma lareira acesa numa noite de inverno. As paredes são de pedra onde vemos: uma estante com pratos de louça antigos, alguidares e potes de barro, jarros de vinho como antigamente e fotografias. Tudo a lembrar o passado. A lembrar as cozinhas e as salas de jantar dos nossos avós. É preciso reservar com antecedência e escolher previamente o que se quer comer. No nosso caso, entre cabrito assado com castanhas, chanfana ou bacalhau. Optámos pelo cabrito e até se desfazia de tão tenro. Preferimos assim: um restaurante com uma ementa reduzida, mas com pratos muito bem confecionados e servidos na hora.
  • Restaurante Sabores da Aldeia, no Candal | À semelhança do restaurante anterior, aqui também não há menu e é preciso reservar com antecedência. A escolha dos pratos, apesar de limitada, inclui os mais representativos da gastronomia da Lousã, como o cabrito assado e a chanfana. Para variar, comemos alheira de caça e (um divinal) arroz doce.

Onde quisemos comer mas não conseguimos

  • Restaurante O Burgo, situado perto do Castelo de Arouce (segunda metade do séc. XI), da Ermida da Senhora da Piedade (local de devoção e culto religioso) e da Praia Fluvial da Senhora da Piedade (piscinas naturais, com água corrente, muito procuradas no Verão). No domingo de manhã, andámos a passear pela zona, mas nem com dois dias de antecedência conseguimos lugar neste restaurante que é o primeiro classificado na Região de Coimbra pelo “Tripadvisor” e muito recomendado pelos habitantes locais.

Gastronomia e produtos regionais

  • Pratos típicos: a Chanfana, o Cabrito Assado e o Sarrabulho.
  • Sobremesas: a Tigelada Lousanense, os Talasnicos e os Serranitos.
  • Licor Beirão, originário da Lousã e cuja produção aí se mantém.
  • Vinho de Foz de Arouce.
  • Mel DOP Serra da Lousã.

Passeio realizado no fim-de-semana de 18 e 19 de Fevereiro de 2017

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15 Comentários

  1. Vivo num concelho relativamente perto da Lousã e confesso (para minha infelicidade) que nunca tive oportunidade de visitar as Aldeias do Xisto, mas depois de ler o vosso artigo e ver as vossas fotografias fiquei com ainda mais vontade de as visitar!

  2. Adoro o blog! A maneira como os textos são escritos, juntamente com as fotografias me fazem viajar sem sair do lugar. Os posts são uma inspiração pra mim e esta será minha próxima viagem de fim de semana em Portugal. Obrigada, parabéns e continuem a inspirar pessoas 🙂

  3. Excelente trabalho de redação, fotografias e paixão pelas viagens.
    Obrigado pela vossa partilha.
    Tantos locais belos que temos no nosso Portugal para visitar.
    Parabéns

  4. Simplesmente brutal!
    Obrigado por darem mais razões para explorarmos Portugal.
    Não tenho dúvidas de que estas aldeias e florestas circundantes farão parte de um próximo itinerário “interno”.

    Já agora, pergunto se conhecem o livro “A Viagem que ainda ninguém fez”. Dei com ele nos CTT no outro dia e pareceu-me um óptimo projecto de redescoberta do nosso país, e um óptimo pretexto para visitar todas aquelas pequenas pérolas.

    Parabéns e obrigado pelo espectacular trabalho que mostram no Viagens à Solta, Sofia e Paulo.
    São uma inspiração para quem gosta de viajar (e para quem gosta de partilhar as suas viagens).

  5. Meu Deus! Td de bom. Lindo! Eu quero ir… Sensibilidade na escrita…quero acompanhar o blog como faço?
    Parabéns Sofia e Paulo!
    Marta Luiza

  6. Já sabem que gosto do vosso blog e do modo interessante como apresentam easta sugestões de viagens. Mesmo com tempo miserável como parece ter sido o que apanharam nesta viagem, têm uma fotos muito bonitas. Este espaço de comentário serve também para dar mais alguma informação, alguma dela com interesse limitado. Muito possivelmente, até os próprios autores do blog não estarão muito interessados se eu falar aqui de comida pouco saudável, mas haverá sempre alguém que estará disposto a dar uma facada na dieta de vez em quando. Pois, na zona da Lousã há uma velha tradição: as sopas de bodas. Eram (ou ainda são, não sei) “sopas” que se comiam no dia a seguir aos casamentos e feitas com sobras de chanfana. A chanfana é carne de cabra velha cozida em vinho tinto. Diz-se que é um prato que surgiu na zona de Coimbra-Lousã porque nas invasões francesas as fontes de água desta zona terão sido envenenadas o que fez com que as pessoas experimentassem cozinhar em vinho. A chanfana é um prato forte (mais adequado para Inverno) que se encontra facilmente em vários restaurantes de Coimbra, Penacova, Miranda do Corvo, Lousã e outras terras próximas, mas as sopas de bodas serão já mais localizadas e mais difíceis de encontrar. Um dos locais onde se encontra isso (e creio que nem sempre) é no Restaurante Museu da Chanfana que oferece “Sopa de Casamento” na sua lista. Quem tenha um bom estômago e vontade de ter uma experiência gastronómica diferenciada, aqui tem mais um atrativo para ir à Lousã.

  7. Adorei, muito útil para planear a minha viagem. É mesmo deste tipo de informação (de terreno e experiência) que eu precisava.
    Votos de sucesso.

  8. Todos os anos tentamos conhecer uma aldeia no nosso Lindo Portugal.
    Este anos estávamos a pensar na região da Lousã e as suas Aldeias de Xisto.
    Impecável!!!
    Já tenho o roteiro feito!
    Vou acrescentar apenas o Parque Biológico da Serra da Lousã que nos parece também muito interessante (https://parquebiologicoserralousa.pt/)
    Muito Obrigado pela partilha.
    Boas Viagens!

    • Olá Rita!

      Ficamos contentes por termos ajudado. Quanto ao Parque Biológico da Serra da Lousã, ainda não conhecemos. Depois diga-nos se vale a pena.

      Beijinhos e boas viagens à solta!

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