Já percorremos quase toda a Espanha de carro. Faltava-nos La Alpujarra, uma zona mítica para os espanhóis, situada na parte sul das montanhas mais altas da Península Ibérica, nas proximidades de Granada. Faltava-nos ainda a província de Múrcia e o Palmeiral de Elche, declarado Património da Humanidade, que há muito desejávamos conhecer. Foram 6 dias intensos, cujo diário escrevemos e partilhámos dia-a-dia na nossa página do Facebook, para inspirar outros viajantes e para recordarmos quando formos velhinhos.
Itinerário no Sudeste de Espanha
Dia 1
Antes de começar mais uma road trip pela nossa vizinha Espanha, ainda tivemos tempo para contemplar o nascer-do-sol em Trás-os-Montes. Estas paisagens melancólicas revitalizam-nos a alma, especialmente quando temos de superar desafios, como escalar os amontoados de pedras arredondadas, conhecidos por Caos Granítico.
Neste momento, estamos a descansar na pequena vila de Hervás depois de um belo repasto à base de boletos selvagens. Foi possível calcorrear a judiaria e contemplar a curiosa arquitetura dos seus edifícios, mas o verdadeiro passeio terá de ficar para amanhã, à luz do dia. As ruas, onde apenas os gatos teimam em deambular ignorando o frio, são estreitas e muito mal iluminadas. Já os bares estão cheios de pessoas a beberem copos de Vino de Pitarra acompanhados por montaditos (fatias de pão com petiscos variados em cima).
Dia 2
Hoje, quando acordámos em Hervás, estava a chover. Por isso, não tirámos as fotografias que tínhamos planeado na famosa judiaria da localidade. O dia, chuvoso, foi passado quase todo na estrada, com uma breve paragem em Zafra para almoçar.
Mais de 600 km depois, encontramo-nos nas proximidades de Granada, onde já tínhamos estado em 2011, altura em que visitámos o incrível Allambra. Amanhã seguiremos viagem para leste, em busca das terras onde se refugiaram os exilados Mouros de Granada.
Dia 3
La Alpujarra foi o último refúgio dos Mouros depois da reconquista de Granada em 1492. É uma região montanhosa na encosta sul da Sierra Nevada, com estradas estreitas e sinuosas. No meio das serras de tons castanhos monótonos, sobressaem aldeias de casas brancas sem telhado, como Soportújar, Pampaneira e Trevélez, a fazer lembrar as que vimos em Marrocos. Nas ruelas, apertadas e íngremes, há gatos fugidios, fontes de água pura, sardinheiras nas janelas, cortinas de pano a cobrir as portas da entrada e bastantes estabelecimentos para turistas.
Ao almoço, provámos o famoso presunto da região, um queijo branco cujo sabor é parecido ao Roquefort, e matámos saudades da nossa sobremesa espanhola preferida – cuajada com mel.
Dia 4
Começámos o dia no Parque Natural do Cabo de Gata, atravessando paisagens vulcânicas e visitando praias invulgares, como a Praia de Mónsul. Hoje estavam 21°C. Por isso, aproveitámos para molhar os pés no Mediterrâneo, enquanto turistas mais ousados passeavam nus na areia negra e mergulhavam no mar.
À tarde, entrámos em Múrcia, a última região que nos faltava visitar em Espanha. Esta noite, vamos descansar num convento em Caravaca de la Cruz. Nem de propósito, nesta que é considerada uma das cinco cidades santas do mundo católico, por conservar um célebre crucifixo, no interior do qual se guardarão fragmentos da cruz em que morreu Jesus Cristo.
Dia 5
Hoje começámos o dia na região de Valência, em Elche (ou Elx como lhe chamam lá). Esta cidade pequena para os padrões espanhóis, mas com a mesma população do Porto, é conhecida pelo seu extenso palmeiral, considerado Património da Humanidade pela UNESCO desde 2010. Ficámos surpreendidos ao saber que as técnicas de cultivo e irrigação nos oásis também foram usadas nesta zona da Península Ibérica desde o tempo da ocupação muçulmana.
Depois do almoço, partimos para norte de Benidorm, para uma pequena localidade chamada Guadalest, onde existe um pequeno castelo e santuário em cima de escarpas rochosas, denominado Castell de Guadalest.
Para terminar o dia e o ano, iremos pernoitar num hotel que fica na base do castelo de Sax, uma povoação a norte de Alicante. Pela segunda vez, em Espanha, acabámos por jantar num restaurante chinês de fraca qualidade por ser o único local que encontrámos aberto na noite de 31 de Dezembro – a que os espanhóis chamam noche vieja – altura em que as ruas ficam rapidamente desertas depois das 19 horas.
Desejamos a todos um ano novo muito feliz! Nós continuamos esta viagem no próximo ano…
Dia 6
Partimos em dois o regresso a casa, para não fazermos 1000 km de uma assentada. Decidimos aproveitar para conhecer Almagro e Ciudad Real, na qual iremos pernoitar. Tínhamos posto de parte parar nestas cidades várias vezes em passeios por Espanha. Ainda bem que desta vez não o fizemos.
Almagro é uma pequena localidade que já teve maior importância noutros tempos. É a capital histórica da comarca do Campo de Calatrava, onde a Ordem de Calatrava tinha a sua sede. O seu ex-libris é sem dúvida a Plaza Mayor, rodeada por edifícios com janelas verdes, suspensos sobre colunas, nos quais há alguns bares e restaurantes. Depois de várias tentativas falhadas a tentar provar o prato Rabo de Toro, foi nesta terra que tivemos o prazer de nos deliciarmos em mais uma aventura gastronómica.
Depois do almoço, seguimos para Ciudad Real e deparamo-nos com uma cidade semidesértica, onde apenas as folhas caídas dos plátanos bailavam ao sabor do vento nas ruas. Deixámos o carro no parque do hotel e partimos à descoberta a pé. Numa das avenidas principais e nas praças centrais, apenas havia lojas, cafés e restaurantes fechados. As poucas pessoas que encontrámos moviam-se apressadas entre edifícios como se as ruas estivessem impregnadas com a peste. Sendo uma cidade como tantas outras, demos uma volta rápida e ponderávamos regressar ao hotel quando começou a anoitecer, pelas 18 horas.
Na Plaza Mayor, ouvimos uma espécie de música e aproximámo-nos para ver melhor. O som vinha dos sinos do Relógio Carrilhão que tocavam uma musiquinha enquanto figurinhas representando Dom Quixote, Sancho Pança e o seu criador, Cervantes, dançavam. Eis que tudo muda: no lusco-fusco, as ruas começam a ser invadidas por pessoas como vampiros num frenesim, barraquinhas do mercadinho-de-Natal abrem, carrocéis fazem as delicias dos mais novos e cheira a guloseimas por todo o lado.
Amanhã regressamos a Portugal.
Viagem realizada entre 27 de Dezembro de 2015 e 1 de Janeiro de 2016
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Hoje este artigo fez-me companhia a caminho do emprego e como sempre surpreende pela escrita envolvente e pelas fotografias maravilhosas … o melhor elogio que posso fazer é que ainda não ía a meio da leitura já estava em viagem … obrigado
Olá José, ficamos felizes por saber que aprecia os nossos artigos. Obrigado pelo apoio.
Olá bom dia… Paulo
Obrigada por partilhar essa sua viagem… Sou louca por viagens e abriu-me o apetite dar essa volta pelo interior de Espanha… mas a partir do alto Alentejo! As fotos estão espectaculares… e o diário muito elucidativo sem ser fastidioso!!!… Obrigada. E BOM ANO!!!
Obrigado pelo comentário Magaly. Desde o Alentejo a viagem fica mais curta, há que aproveitar 🙂
Olá Paulo: antes de mais, bom ano! Foi bom ler este artigo e recordar alguns lugares por onde já passei. Com exceção de 2015, todos os anos tenho viajado de carro por Espanha e por vezes descubro cidades que não estão no plano inicial mas acabam por se revelar boas surpresas. Obrigada.
Obrigado Eva. Bom ano para ti e para o Luis também 🙂
Todos os artigos, imagens e escrita são da melhor qualidade. Quase viajamos sem sair de casa. Obrigada pela partilha.
Tão bom saber que desse lado há alguém que gosta do que fazemos. Obrigada!
Desconhecia que hervas tinha essa famosa judiaria hehehe. Pode ser que este ano faça um pouco desse percurso. Já andámos várias vezes pela Extremadura e Andaluzia até ao cabo de gata, Elche e murcia já me tinham despertado a curiosidade.