“A pandemia é uma oportunidade para descobrir que, quando vivemos de uma forma mais lenta, sentimo-nos melhor – quando meditamos, quando observamos os pássaros, quando ouvimos a natureza.”
(Fréderic Lenoir)
Descobri o Paul do Boquilobo, uma reserva natural situada entre os concelhos da Golegã e Torres Novas, através de um artigo da National Geographic dedicada aos “Paraísos em Portugal”.
Nesse artigo, fiquei a saber que esta importante zona húmida esteve em risco de se perder, porque as explorações agrícolas foram destruindo a floresta ao seu redor; uma urbanização esteve quase a ser construída nas imediações e uma estação de tratamentos de águas residuais chegou mesmo a escorrer para este santuário de aves e peixes, répteis e batráquios.
Todavia, em meados da década passada, a região juntou-se para salvar o seu património natural e, em vez de desaparecer, a reserva foi aumentada. Só isso despertou logo em mim a vontade de ir conhecer esta área protegida. Foi, porém, esta frase de José Saramago, que cresceu na Azinhaga, a 5 km do Paul, que me decidiu definitivamente a visitá-la: “Um lago, um pântano, uma alverca que o criador das paisagens se tinha esquecido de levar para o paraíso.”
Trilho de descoberta do Paul do Boquilobo
A melhor forma para conhecer o Paul do Boquilobo é a pé seguindo o trilho assinalado na reserva (circular, 5.6 km). Como é plano e curto, é um bom passeio para fazer em família e com crianças.
O percurso pedestre começa diante do Centro de Interpretação e não há como não o ver. No início, é misterioso, já que ficamos rodeados de verde, como se estivéssemos a atravessar uma cortina para outra realidade.
Do lado de lá, deparamo-nos com um grande campo plano, de onde vão levantando voo várias aves enquanto caminhamos por um longo carreirinho de terra. Identificamos cegonhas e garças, mas vemos e ouvimos outras espécies.
A seguir, percorremos uma zona de montado onde somos surpreendidos pelo tamanho dos sobreiros. Apetece-me abraçá-los e deitar-me na mãe Terra, mas o Paulo não sente essa vontade e continuamos a andar até ao primeiro de dois observatórios, uma casinha de madeira com vistas para uma zona húmida, um espaço acolhedor que convida à contemplação, não fossem umas vespas gigantes que me obrigaram a fugir esbaforida.
Continuamos a caminhada por uma zona de freixos, ladeada por delicadas roseiras bravas e eis que chegamos ao segundo observatório, igualmente de madeira aconchegante.
Entramos e vemos um grande lago e diversas aves. Devíamos ter trazido os binóculos para os observar com mais pormenor mas, mesmo assim, é um cenário cuja beleza nos obriga a parar e a contemplar. Ou, pelo menos, durante alguns minutos. Até o nosso ego ficar aborrecido e nos começar a dizer que tem mais que fazer, que não gosta de estar parado, que quer pegar no telemóvel e estar ligado às redes sociais, que não pode ficar para trás, que a vida é demasiado curta para ficar sem fazer nada, quanto mais a observar aves.
Há, todavia, momentos na vida em que temos consciência de que corremos numa roda como os ratos em cativeiro. É então altura para parar, para aborrecer o ego, para o ouvir dentro de nós a protestar, para o sentir a invadir-nos os pensamentos, para assistir às suas tentativas de se sobrepor à nossa essência, para ignorarmos a sua fixação pelo passado e pelo futuro. É, enfim, altura para nos concentrarmos no presente.
Normalmente, consigo-o fazendo caminhadas, mas desejo viver de uma forma ainda mais lenta e parar mesmo, por mais tempo, seja numa casinha de madeira, seja à sombra de uma árvore, seja deitada na terra a observar os pássaros e a ouvir a natureza. Porque sei que, desse modo, me sentirei bem e me aproximarei de um estado de libertação.
Agora só me falta convencer o Paulo.
Sobre o Paul do Boquilobo
A Reserva Natural do Paul do Boquilobo é uma planície de pântanos e zonas húmidas, rodeada pelos rios Tejo e Almonda.
Foi declarada Reserva da Biosfera pela UNESCO em 1981, para proteger cerca de 200 espécies de aves, na sua maioria aquáticas, que por aqui passam nas várias épocas do ano. Entre elas, destaca-se a maior colónia de garças da Península Ibérica. São elas, aliás, o símbolo do Parque onde nidificam a partir de fevereiro/março, permanecendo durante o verão.
Para nós, a reserva natural foi uma agradável surpresa, não só pela tranquilidade e silêncio, interrompido apenas pelo canto das aves, mas também porque vimos muitas mais espécies do que estávamos à espera.
Dicas e recomendações
- A parte de que menos gostámos no trilho foi desde o segundo observatório até ao ponto inicial, já que se percorre um estradão pouco interessante. Em alternativa, pode-se regressar pelo carreirinho do início.
- Faça a caminhada em silêncio, uma vez que se trata de uma zona com grandes concentrações de aves. O ruído e movimentos bruscos podem perturbar os animais.
- O período ideal para observar aves é entre o fim do outono e da primavera.
- Na época de chuvas, alguns troços do percurso pedestre podem ficar alagados, logo intransitáveis.
- Não se esqueça de levar uns binóculos.
O que visitar nas proximidades
- Golegã (6 km)
- Torres Novas (11 km)
- Castelo de Almourol (25 km)
- Santarém (35 km)
- Tomar (38 km)
- Médio Tejo
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Bom dia, Sofia, ao ler o texto senti que também lá estava, caminhando e distanciando-me do rebuliço da vida. Obrigada pela partilha.
Eunice (Leiria)